A negação como base da evolução
- Marcelo Kassab
- 20 de jan. de 2023
- 3 min de leitura
O tempo deixa suas pegadas na linha da história...
Imagine-se como um feto que se desenvolve em bebê, criança, adolescente e caminha pela vida adulta até chegar à velhice.
A cada fase, sua história se constrói individualmente em meio ao contexto histórico, no qual você está inserido. Anos, décadas e séculos são marcados pelas suas idiossincrasias.
Coletivamente, a história também se faz em momentos diversos. Hegel chamou de "Zeitgeist" ou "Espírito do Tempo" aquilo que constitui e caracteriza um período. Não pensemos aqui no sobrenatural, mas algo como constituição mental.
A nossa realidade, segundo a percepção hegeliana, passa por estágios, assim como os seres orgânicos que nela habitam, porém, apenas o ser humano é capaz de adquirir uma maior consciência conforme vai se desenvolvendo. Destarte, os animais nascem, crescem e morrem, mas só os humanos têm que lidar com a ciência de sua finitude.
E assim é que o real toma forma como mentalidade/espírito ao progredir no decorrer da história, quando o homem — cada vez mais — obtém consciência de si mesmo.
O desenvolvimento da realidade ocorre nas etapas sucessivas que compõem as eras e nos designa verdades parciais. Parciais porque a história ainda não chegou ao final e sua totalidade é a somatória das verdades fracionadas das épocas que se sucedem.
Hegel utilizou uma metáfora sobre o comportamento dos filósofos perante a história:
"A Coruja de Minerva levanta voo ao cair do crepúsculo".
É quando determinado período finda e as épocas se ultrapassam. Pois, durante a sua trajetória, o tempo deixa suas pegadas na linha da história; a sua marcha. Assim, as parcialidades se somam a caminho da totalidade.
Agora, voltemos ao início deste texto e a negação de nós mesmos. Hegel nos apresenta três etapas para explicar os padrões encontrados na história.
Desse modo, então, 1) o ser humano, quando bebê, afirma-se e desenvolve-se ao negar o estágio de feto, deixando a vida intrauterina em direção ao mundo. 2) A criança, a fim de evoluir e afirmar-se, necessariamente nega seu estágio de bebê quando começa a ter a autonomia nos seus passos e no início da fala. E assim, sucessivamente, 3) na fase adulta, rumo à maturidade e à velhice na direção do fim corpóreo.
Entre a "afirmação", "negação" e "negação da negação", a história se constrói, progride e remonta as peças do quebra- cabeça evolutivo.
Quanto à frase que dá título a esta reflexão, brotará outro conceito: o de Aufhebung. Tal proposição de Hegel engloba negação, conservação e elevação.
Observe que a negação nos é inerente e precede a conservação, pois dizemos que nos conservamos ao considerar o fato de permanecermos humanos. Prosseguindo com a teoria de Hegel, na sequência nos elevamos – por meio da transformação do que éramos – no que somos.
Baseado nesse contexto, constatamos que as progressões ocorrem de modo organizado e padronizado. A realidade acompanha o movimento da história e a negação de nós mesmos se faz de modo natural e fundamental para a nossa evolução como seres únicos, imersos numa coletividade que também se nega, conserva e eleva. Enfim… caminha. Todos inseridos na história.
Convido à reflexão da negação sobre outro prisma. Evoluir, nos diversos aspectos da humanidade, está no ato de deixar o casulo da ignorância e prosseguir em meio ao aprendizado que nos é apresentado, por meio das nossas experiências. Impossível é negar o que se foi como forma de esquecimento, pois presente e futuro são construídos sobre as vigas do passado.
A mudança requer negação, sem que se abandone totalmente o outrora para – enfim – alçarmos os degraus da escalada evolutiva.
E você? O que foi obrigado(a) a negar de si para alcançar a elevação pessoal?
Deixe seu comentário.
Marcelo Kassab.
Escritor e Cirurgião dentista.
Marcelo, meu querido amigo, eu adoro ler os seus textos filosóficos que sempre me levam a reflexão. Dentro do contexto evolutivo da humanidade percebo que na negação cada um vai deixando para trás uma etapa na vida. Mas, apesar disso sempre carregam dentro de si a criança, o jovem adolescente, o adulto, todos caminham juntos até a finitude. Não são fases estanques e nada se abandona. Como personagens da nossa história todos estão juntos dentro de nós e nos ajudando a tomar as decisões na vida nos momentos certos.
Parabéns Marcelo!
Adorei o texto, não tinha lido antes, e achei muito interessante… me fez refletir “coisas” da vida!
Que orgulho de ter você como meu primo!!
Gi e Pedro
Lindo, pai!!
Muito orgulho de você! ♥️
Parabéns! Lindo texto, em algumas passagens da vida é necessário bloquear algumas coisas para outras evoluírem. Como exemplo: período da formação universitária ou quando se almeja ser um concursado. Me sinto inserido nesses dois exemplos, tive que esquecer lazer por um longo tempo para ter foco e sucesso naquilo que eu estava buscando para minha vida. Muito top seu maravilhoso texto.
Cosme Santos
Negar faz parte do processo de crescimento. Para ultrapassar etapas temos q negar. Paradoxo, negação x evolução. Negar para continuar inserido no sistema, sem, contudo, passar por cima de valores éticos e morais. Grande desafio da vida.