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A árdua fronteira entre o fracasso e o sucesso

A cultura do sucesso imediato, presente em letras de música e discursos motivacionais, simplifica o processo...

Ao perguntarmos a um jovem da região metropolitana de São Paulo sobre seu maior sonho, é comum ouvirmos respostas como: "Quero ser cantor de funk" ou "Quero ser jogador de futebol". Para muitos, essa aspiração reflete lamentação, como se fosse um empecilho para seguir sua vida normalmente.


Em diversos casos, esses jovens acabam abandonando os estudos, afastando-se da escola para jogar futebol durante horas nas ruas ou cantar música em praças, becos e vielas. Bem verdade que sonhar seja essencial, como bem disse Mano Brown: "É necessário sempre acreditar que o sonho é possível"; e são essas frequências de pensamentos que nos fazem mais resilientes. Porém, ao mesmo tempo, a esperança precisa vir atrelada às estratégias e análises probatórias, pois – afinal – o sucesso nesses campos depende de diversos fatores (como ambiente, talento, disciplina, oportunidades, etc.) e as estatísticas são implacáveis, mostrando que a chance de ascensão ao topo gira em torno de 1%, enquanto a possibilidade de se tornar um profissional mediano não passa de 20%; isso sob uma estimativa otimista.


Consequentemente, é bem provável que muitos jovens não terão seus sonhos realizados. Por esse motivo, vale observar que o termo “esperança” vem do verbo esperançar, não estando relacionado ao verbo “esperar”, como bem dizia Paulo Freire. Diante disso, de nada é proveitoso alguém ficar imobilizado por conta de um possível fracasso.


Contudo, o que fazer perante essa possibilidade? Render-se à frustração? Entrar para o caminho do dinheiro fácil e ilegal? Responder “não” parece ser um tanto óbvio, mas a cultura do sucesso imediato, presente em letras de música e discursos motivacionais ("basta acreditar" ou "se você quer, você consegue"), muitas vezes, simplifica o processo. Sabemos que não é bem assim. É para além do “basta”, pois a vida exige uma complexidade de fatores que muitos não enxergam por sofrerem consequências do fenômeno, ignorando fatores externos, privilégios e até mesmo o acaso.


Expressões como "Minha professora não acreditou em mim" aparecem com frequência em músicas e entrevistas de atletas e artistas, como se os educadores fossem podadores de sonhos. De fato, pode haver exceções vindas de amargurados, mas o verdadeiro papel dos professores é preparar seus alunos para a realidade, ajudando-os a identificar suas aptidões e a construir alternativas viáveis para o futuro. E o ideal não é apostar tudo em uma única possibilidade, mas estruturar um plano de ação com múltiplas opções.


Por exemplo:

· Plano A: Tornar-se jogador de futebol.

· Plano B: Abrir um negócio próprio.

· Plano C: Passar em um concurso público.

· Plano D: Construir patrimônio por meio de investimentos.


Essa abordagem reduz a vulnerabilidade diante do fracasso, tornando menor a probabilidade de qualquer um ficar à deriva, pois oferece caminhos alternativos sem invalidar o sonho inicial.


Portanto, nossos sonhos são molas propulsoras; e ao direcioná-los ao destino correto, podemos usufruir de seus frutos. Ter um objetivo de vida é fundamental, mas igualmente essencial é garantir meios de subsistência e estabilidade. Em muitos casos, já não basta deixar de realizar seus sonhos, imagine ficar sem ter condições básicas para sobreviver. E caso não dê certo, importante é termos "cartas nas mangas” (garantia de meios de subsistência e estabilidade nesse mundo cada vez mais competitivo) e, quem sabe, ter uma vida mais amena, no anonimato, e mais tranquila.


Jorge Gomes.

Pedagogo.

 
 
 

7 Comments


Guest
Mar 24

Viver é uma arte, um chocolate e uma surpresa!

O futuro é duvidoso e a nossa existência precisa de preparo, de laços que nos fortalecem, e de dinheiro, porque os sonhos são para todos, mas o mundo real não sonha....

Ele te rouba, te cobra, e te faz perceber que dar certo na vida nem sempre é por merecimento, nem por amor, muito menos justiça, mas sim por uma soma de fatores que te levam a uma coisa e outra, e é nessas coisas que a gente vai de coisa em coisa, e acontece tudo junto e misturado, *coisando" a nossa cabeça, e o destino é isso: o que fazemos, o que deixamos de amar, e o que nos arrependem…


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Guest
Mar 24

Parabéns amigo. Excelente texto e muito didático.

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Antelmara Silva
Mar 23

Muita coragem trazer a pauta de alguns elementos que fazer os movimentos sociais, e quando vc traz a discussão das indiferenças da vida e o papel da escola, percebemos o quanto é importante irmos além dos protocolos educacionais e percebermos habilidades e competências que infelizmente não serão mensurados em outros lugares....

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Artigo excelente! Costumo dizer que os sonhos sonhados acordados criam a fantasia que precisamos para permanecermos estabilizados nos trilhos da vida; pois, afinal, o que buscamos senão a materialização dos sonhos desejados?


Um (a) jovem pode não estar preparado ou disposto para ceder em prol de uma necessidade. Nesse sentido, o que o mercado oferece senão meios para manter essa estrutura funcionando, onde muitos lutam sem planejamento e/ou planejam sem agir?


Gratidão por esse texto, Jorge Gomes.

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Robério
Mar 23

Belo texto que faz a gente refletir explorando vários aspectos de um problema tão constante e persistente na realidade brasileira: a falta de oportunidades e referências para nossos jovens que os fazem oscilar entre os sonhos de sucesso "fácil", a desesperança da vida real e as alternativas perigosas que destroem tantas vidas. O mesmo capital que vende os sonhos na forma de publicidade é aquele que fecha as portas, o Estado vira as costas e a sociedade entorpecida assiste a esse drama cotidiano mal compreendendo o que acontece (sonhando?).

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