Pensar melhor ou pensar o melhor?

Os últimos tempos escassearam beijos e abraços, verdadeiros e falsos, mas não emudeceram palavras...

Somos o que pensamos e o que pensamos nos identifica. Pensar melhor nos faz melhores.

Os dias se sucedem, levando metade dos rostos; apenas olhos às vistas.

Olhares desconfiados, medrosos, preconceituosos, descrentes e negacionistas. Há para todos os gostos e paladares, desde que não afetados pela pandemia.

Quando se perdem alguns sentidos, outros se sobressaem; quem dera os do arrependimento e, em casos de extrema felicidade, os da consciência.

Os meses se despedem, carregando consigo vidas e deixando sequelas, revelando caráteres, destruindo antigos conceitos e construindo – para os que entenderam a mensagem – reflexões.

Porém, ainda não chegamos ao fim das nossas mazelas.

Somos aglomerados de esperanças em meio aos inconsequentes.

Esquecemo-nos da vacina contra o descaso daqueles que deveriam cuidar da gente e permanecemos infectados, em doses homeopáticas, com os vírus que subjugam nossas almas à ignorância e à apatia.

Os últimos tempos escassearam beijos e abraços, verdadeiros e falsos, mas não emudeceram palavras.

Consolamo-nos virtualmente, enquanto assistimos pelas janelas dos nossos palácios, abismos sociais sem fim, enterrando vivos os restos de dignidade daqueles que já haviam deixado seus corpos à mercê das suas próprias desesperanças.

Muitos não verão o futuro e outros estarão indiferentes, pois já se entregaram às contas dos anos, como penitências rezadas nos terços, após confissões de pecados inventados e concretizados.

Mas se somos o que pensamos e o nosso pensamento nos identifica, não gostaria da pecha de pessimista.

Quero apenas pensar melhor e não necessariamente “o melhor”, no sentido otimista da palavra.

Refiro-me ao embate conosco, no choque dos rostos desmascarados com o recôndito das nossas desgraças, como forma de expurgo, a fim de que o amanhã nos arremeta e não torne vã a nossa fé.

Marcelo Kassab.

Escritor e Cirurgião dentista.