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Sim, Deus não existe! Não, Deus existe!

Atualizado: 13 de jan. de 2023

Mas Deus teria sido o criador de tudo e de todos e, além de onipresente, onisciente e onipotente?...

O senso comum, em uma de suas falas, ressalta a ausência de Deus nos corações como um dos principais motivos para as mazelas que assolam estes tempos. Não seria uma visão simplista demais para a nossa falta de empatia e alteridade? Seriam os ateus, pessoas pouco confiáveis ou desprovidas de ética e respeito ao próximo, apenas por possuírem convicções contrárias às das religiões ou à filosofia deísta?


Muitos tentam – por meio da razão – desenvolver teorias cujos sentidos alcancem suas crenças, enquanto outros se desfazem do bom senso para impor suas convicções. Por outro lado, há os adeptos de uma posição mais amena, sob as copas arrefecidas do equilíbrio, protegendo-se das acaloradas discussões.


Já a Filosofia, desde sempre, procura questionar e colocar em discussão tudo o que aflige a humanidade através da reflexão, argumentação e do conhecimento.


Ainda na Grécia antiga, Platão já sugeria o "Bem" a ser alcançado no mundo das ideias, usando o sol como fonte de iluminação, teoria que séculos mais tarde serviria de base para Agostinho discorrer sobre a existência de Deus, valendo-se de sua Teoria da Iluminação Divina.


O conceito de ‘’primeiro motor’’, apregoado por Aristóteles em sua metafísica, pode ser interpretado como a existência de uma causa que não é passível de ser originada ou de finitude, sendo imóvel, originando novas causas e consequências. Se assim não fosse, regrediríamos ao infinito sem encontrar o início de tudo, o que parece menos razoável para os que creem na criação divina deste mundo. Portanto, sempre haveria algo imutável (théos), originando um movimento em cadeia, segundo o filósofo estagirita. Sem dúvida, uma teoria que pode ser utilizada a favor dos criacionistas.


É importante lembrar de que Aristóteles viveu numa época muito anterior ao surgimento das religiões tais quais nós conhecemos hoje, trazendo uma conotação racional ao debate.


Indo ao encontro da reflexão anterior, Tomás de Aquino, em sua terceira via para a existência de Deus, declara que um ser contingente (aquele que pode ou não acontecer) possui em outro a sua causa eficiente (originária), ao contrário do ser necessário (aquele que deve existir), o qual possui em si mesmo a sua causa eficiente. Assim, seria o mundo sensível (este em que vivemos), contingente e dependente de um gerador precedente.


Mas Deus teria sido o criador de tudo e de todos e, além de onipresente, onisciente e onipotente, também seria transcendente, como acreditam os cristãos, islâmicos e judeus? Poderíamos considerá-lo imanente, conforme pregam as religiões panteístas e o filósofo Spinoza (Deus sive natura), citando a presença do criador na natureza?


O pensamento kantiano, mesmo não descartando a presença divina, presume a nossa limitação a respeito de conclusões sobre Deus, posto que seria difícil fundamentar algo intransitável pelos sentidos, enquanto Descartes busca racionalizar a existência deífica através de uma abordagem acerca do finito (o ser humano, por exemplo) e a possibilidade de Deus através de algo acima do homem; o infinito.


David Hume, filósofo empirista, era contrário ao senso comum e questionava a metafísica, priorizando a experiência e o saber científico, ao passo que Nietzsche, à medida que matava Deus afogado em metáforas, determinava que os valores morais deveriam ser encontrados na nossa realidade e não no mundo transcendental; tese certamente endossada pelos ateístas.


Essas proposições nos chamam à responsabilidade pelos nossos atos e dão à humanidade um protagonismo talvez indesejado, pois retira da divindade o papel de escudo sobre as ações humanas, uma vez que o homem e a religião transformaram Deus em um ser às suas imagens e semelhanças, subvertendo a ordem da criação e impondo o conceito de que pelo divino tudo se justifica (a morte, o sofrimento, a pobreza, os privilégios de reis e dos líderes religiosos), fazendo jus ao mundo materialista e artificial em que vivemos.


Traçando-se um paralelo com o sistema capitalista predominante, não há como contestar a utilização de Deus como forma de investimento terreno, a fim de se colher dividendos e benesses num pretenso paraíso.


São teorias formuladas e reformuladas, enquanto a ciência avança e continua incapaz de provar a existência ou inexistência de uma origem divina para o universo, alimentando vozes agnósticas.


Seria Deus a resposta para todas as nossas inquietações ou a razão para indagações angustiantes? Teríamos no Divino um refúgio para aquilo que não conseguimos entender e evitar, visto que nada aconteceria senão pela vontade deífica? Ou nós temos a obrigação de assumir uma posição ativa, inquirindo dogmas e imposições creditadas a Deus?


A discussão filosófica sobre o tema é sempre válida porque abre caminhos para novas ideias, podendo entrajar antigas concepções com roupagens atualizadas, posto que desata os nós alienantes da normatização.


Assim, a importância do debate reside mais nos questionamentos e menos nas definições, quase sempre emolduradas por aporias.


Em se tratando de Deus, por mais que procuremos refinar e fundamentar nossos conceitos, o embate jamais morrerá. Porém, estará eternamente condenado a desfalecer nos braços ávidos, generosos e necessários da fé.


Marcelo Kassab.

Escritor e Cirurgião dentista.




5 comentarios


Invitado
19 mar 2023

Excelente Marcelão. Eu adoro esse assunto.

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Marcelo Kassab
Marcelo Kassab
19 mar 2023
Contestando a

Mesmo sem uma definição do tipo "bater o martelo", é um tema que possui vários assuntos subjacentes, e aí é que vem o instigante.

Muito legal você ter lido!!!

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Invitado
15 feb 2023

Esperando o debate com o Judeu

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Invitado
22 ene 2023

Sim, tudo nos braços da fé!

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Marcelo Kassab
Marcelo Kassab
24 ene 2023
Contestando a

A Fé toma conta das nossas limitações. Grande abraço!

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